domingo, 24 de janeiro de 2010

AVISO

Eles vão descer dos morros
Com paus e aerrequinze
Despenteados e esgazeados
Famintos
Mulambentos
Sem os dentes da frente
--eles nunca tem os dentes da frente.

Vão descer das caatingas
Dos cortiços
Das palafitas
Esfomeados
Atormentados
Com os filhos catarrentos
--e já sem os dentes da frente.
Não precisam saber muito:
Somente o ato ancestral
De martelar crânios.

Gafanhotos ávidos
Em milharal verde
Não saciarão de comida.
Vão comer você,com risos formidáveis.
Eles vão sair dos buracos
Barracos
Pontes
Marquises
Com aquelas roupas velhas
Que você doou no último inverno.
No hálito a cachaça reacendendo
Na cabeça os piolhos pululando.
Nas calças o cheiro da urina dormida
--e sem os dentes da frente—
trarão pedras nas mãos
sangue no olho e uma alegria incontida.
Esmagarão crânios com a energia dos recém despertos do torpor.
Vão comer de tudo da sua geladeira e vão rir a bandeiras despregadas de suas cuecas de seda
E vão limpar a bunda com as pantufas da sua mulher.
Eles sairão das construções abandonadas
Dos porões
Dos esgotos
Dos buracos
E usarão seus pedaços de faca sem fio para furar a sua barriga,rasgar a sua carne e cortar seu pinto.
Vão usar os seus sapatos novos
Os patins da sua filha
A guitarra do seu filho
E terão prazer especial em pisotear
Sua sogra,sua mãe,seus velhinhos.
Falarão errado,cuspirão no tapete e entrarão de sandálias mal cheirosas na sua banheira
--e também sem os dentes da frente—
Alguns vão querer foder sua mulher e suas filhas
E nem tirarão os trapos
No máximo vão por para fora aquele pinto sujo,cheio de esmegma verde,com um fedor horroroso e meterão à vontade.
Eles sairão das roças,das matas,das periferias do inferno.
E trarão foices,machados e ancinhos interessados em cortar pescoços.
Terão ouvidos moucos
A súplicas,desculpas e perdões.
Satisfeitos de por fim poderem comer não lhes custará nada gozar com o seu terror.
Talvez,com certa gravidade que os roceiros têm,matem,
Juntem os corpos numa pilha e ponham fogo como quem limpa a seara.
--sem os dentes da frente,eles também—
Darão aos gatos o caviar e o fois gras,cozinharão o filé mignon no feijão e acharão a maciez suspeita—lhes parecerá carne de preá.
Com aquelas mãos fortes,grossas,de unhas pretas,segurarão o seu pescoço e apertarão com facilidade.
Sentirá o horroroso bafo daquela boca fétida,com bigodes amarelados, a lhe falar impropérios que você não vai poder contestar.
E aí o que você vai fazer?